City of Iron

Quand chegou em casa, como sempre a porta do quarto de seu pai estava trancada.

Ele foi no banheiro se lavar antes de dormir, e curiosamente naquela noite o sangue parecia mais difícil de lavar que a tinta do rosto.

Ele olhou um pouco no espelho sem conseguir de fato pensar em qualquer coisa, de forma que seguiu para seu quarto e se deixou cair em cima da cama para dormir.

Ao se ver deitado na neve, Kaleb se ajeitou, ficando sentado na mesma, com as mãos na neve, ardendo pelo frio.

Olhando o homem com os machados, estranhamente ele não sentiu medo algum, e ficou apenas observando-o.
Saber que a voz dele era igua a de seu pai era no mínimo curioso...Era um pouco triste não ser ele... Mas ao mesmo tempo ficou feliz que fosse assim... Como se aquele homem dos machados servisse como substituto. Ele se perguntou se por acaso aquele homem se chamava Assis.

Ele demorou um pouco pra responder,  tirando a mão do chão e fitando um pouco a palma da mão aberta, depois fechando a mão dormente pelo frio.

-Aliviado.

Ele sentia como se tivesse se livrado de correntes que o prendiam a mais tempo do que se lembrava.

-Sim.

Kaleb se levantou da neve, limpando um pouco as roupas. Pra ele aquilo era como poder respirar depois de um bom tempo sufocado.

-Como desejar.

Sua visão foi ficando totalmente branca até chegar o momento de acordar.

Ao acordar,  ficou um pouco na mesma posição que tinha acordado no sonho. Ele coçou a cabeça. 

-Uma cabeça de lobo então. 

Ele tomou um banho e se arrumou para ir no trabalho.  Almoçou e seguiu em direção ao clube de arqueirismo,  já que começar a faltar poderia trazer suspeitas. 

Ele trabalhou normalmente no dia, embora um pouco mais focado. Se nos outros dias ele parecia disperso por olhar os arqueiros e arqueiras e atrasar seu trabalho,  nesse dia ele estava disperso de forma a nem olhar pras pessoas, e o mestre Zura percebeu. 

No final do treino ao pôr do sol, ele barrou Kaleb um pouco,  perguntando se ele estava bem. E como não tinha acredito quando Kaleb disse que estava, mais uma vez o mestre lhe entregou o arco e o mandou ficar em frente ao alvo.

E tal como os outros dias, sem prestar atenção na técnica,  Kaleb posicionou a flecha, elevou o arco, puxou a corda e mirou por alguns segundos. Katsura franzia um pouco a testa observando sua postura e movimentos. ... Uma postura hostil, e uma aura fria.

Quando soltou a corda, a flecha foi direto pro centro do alvo.... Derrubando o alvo e fazendo a própria flecha se quebrar. Ele já tinha entortado algumas flechas como todos os outros, mas era a primeira vez que ela quebrava. Entregou o arco ao mestre, que o olhou ir embora sem dizer mais nada. 

Kaleb voltou para casa um pouco,  e colocou a pintura no seu rosto, olhando o espelho.




Nisso ele ajeitou a corrente na cintura por debaixo das roupas, ajeitou o arco que tinha ganhado do mestre Zura nos ombros, colocando algumas flechas na mochila e foi em direção à floresta.

Demian incomodou-se ao sentir alguém o cutucando e apenas tornou sua cabeça ao lado. No entanto, continuar dormindo não lhe era mais uma opção ao involuntariamente inalar aquele bafo intenso de café.

— Hmm? — Ele entreabriu seus olhos, analisando a figura que havia o chamado.

Levantou-se da cadeira e apanhou sua bagagem no compartimento superior a ela, pondo-se a acompanhar o motorista.
— City of Iron? — Questionou, com uma expressão de confusão, enquanto rolava os olhos pelo local através das janelas. — Acredito que haja um erro. — Exclamou, pousando a mão sobre o ombro direito do motorista e virando-o para si. — Esse ônibus ia pra NY. O que diabos, amigo? — Questionou desafiadoramente. Não permitiria ser enganado tão simplesmente assim.

— Ah, eu definitivamente não sonhei. Eu tenho a droga dos papéis aqui!  — Disse-lhe em voz alta, colocando-se a acompanhá-lo cautelosamente pelo semáforo enquanto observava os arredores com um misto de espanto e frustração. — Isso não tem muito sentido. De toda forma, não estou com saco pra isso. — Murmurou, e apanhou seu celular do bolso frontal do sobretudo que trajava. Sem perder tempo e, ainda acompanhando o motorista do ônibus, ele ligou para o telefone nacional da polícia.

"City of Iron, é? Isso só pode ser brincadeira." Pensou consigo mesmo. — Não, não é nada. Perdão. — Disse, com um tom de voz artificialmente suave. Guardou o telefone celular no bolso e grunhiu os dentes.

Àquela altura, Demian já supunha que sua sanidade fosse completamente questionável. De forma a evitar confusão mental e stress, ele determinou que refletir demais acerca daquela situação não lhe beneficiaria de qualquer forma. Assim sendo, decidiu que seguir a onda das coisas com calma e cautela. Suspirou e avançou pela padaria, aproximando-se do motorista de seu ônibus uma vez mais.


— Aliás, qual é mesmo o seu nome, senhor? — Questionou o motorista, enquanto fazia um breve preparo mental para resistir a uma possível e desagradável onda de bafo. — E você pode me contar um pouco sobre essa cidade? Se possível, sabe também de algum lugar onde eu possa me estabelecer? — Indagou-o, enquanto rolava os olhos pelo estabelecimento, analisando o tipo de pessoa que o frequentava, e, também, o que dispunham à venda.

— Que é uma cidade de merda eu já percebi. — Demian concordou, e deu uma pequena risada em seguida e enfim suspirou um pouco mais tranquilamente. Sentia-se de certa forma aliviado com a sinceridade do motorista, embora fosse dono de aspectos um tanto quanto porcos. Em seguida, o rapaz levou seus olhos à atendente do local que, coincidentemente, direcionou sua atenção e conversa a ele. —  Eu me chamo Demian, senhora... — fez uma breve pausa para recapitular o nome da senhora, que naquele instante fugia-lhe à mente. — ...Verona. — Finalmente disse. — Não sinto tanta fome agora, mas obrigado por perguntar. — Ele agradeceu.

— ...Talvez eu passe por aqui mais tarde. — Disse à Veronica, dando de ombros após um breve gesto de adeus com a mão esquerda. Agarrou firmemente sua bagagem pela alça e segurou-a na altura do ombro, enfim retirando-se do lugar.

"Exatamente, preciso estabelecer-me em algum lugar antes de maquinar e refletir sobre os últimos acontecimentos. É necessário um pouco de calma; definhar-me em ansiedade não me traria nenhum resultado." Pensou consigo mesmo, convencido de que precisaria de um lugar como seu porto-seguro antes de arriscar-se a compreender o que diabos era aquele lugar.

Cautelosamente, ele avançou pela calçada da estranha cidade em busca de um lugar em que pudesse se alojar.

Koto acordara numa nova cidade, um novo começo, uma nova vida.

Koto se virou em direção a mulher. A encarou de forma ignorante.

- Olha pro onde anda, parsa! A próxima vez eu vou te encher de porrada! Otária do caralho... - mostrou o dedo do meio para a mulher e voltou a andar para longe.